
'Quando você for convidado pra subir no adro, da fundação casa de Jorge Amado, pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos, dando porrada na nuca de malandros pretos, de ladrões mulatos e outros quase brancos, tratados como pretos...' Agora muitos deles mortos (grifo nosso). A primeira estrofe da música 'Haiti', de Caetano e Gil, serve como prefácio para a maior tragédia da história do primeiro país livre das Américas e como reflexão para uma humanidade sob expiação. A notícia (14/01), produzida pelos repórteres da Globo News e de outros órgãos de imprensa do Brasil e do mundo, acertou na mosca o alvo da 38ª semana do Target NewsWeek, game de análise de notícias que classifica as cinco que fizeram a diferença ao longo da semana. A primeira estimativa da Cruz Vermelha é de 45 mil mortos no terremoto, mas esse número pode chegar a 500 mil. País mais pobre das Américas, o Haiti acumula séculos de miséria e de conflitos políticos, diante de um olhar indiferente da maioria do planeta. Naquela que é considerada a maior catástrofe da história da humanidade, o mundo assiste pela TV a expiação de sua própria imagem sempre negada no cotidiano, como se tudo pudesse ser encarado como algum desses reality show de quinta categoria. E muitos se perguntam ainda se o Haiti não é aqui ou em nenhum lugar. Graças a Deus é só lá, diriam muita gente boa de fé! Depois do terremoto e de tantas desilusões sociais, nem o Haiti está mais lá, pois aquilo não pode ser mais considerado um país de verdade! Nesse mundo de expiação, as celebridades alimentam o chamado marketing das ajudas humanitárias, aquelas que chegam sempre depois que já não há mais pedra sobre pedra. Tem celebridade que até escolhe a jogada certa para ganhar alto com a monetização gerada pelas catástrofes sociais. O que será preciso acontecer para que sejamos algo que realmente pudéssemos nos orgulhar? A cada tragédia o mundo é balançado por notícias ruins, mas nem tudo isso serve de inspiração para que as coisas mudem de fato. Sempre será preciso novas tragédias de grande porte para que pensemos em mudar o modo como tratamos o nosso próximo? Para que o mundo se una de verdade em torno de soluções de problemas comuns? Não foi assim após os atentados de 11 de setembro, tampouco depois das tsunamis que arrasaram a Ásia em 2004 e do furacão Katrina que quase dizimou a população de Nova Orleans, em 2005. No caso das tsumanis, o noticiário ficou na periferia da informação que interessa, enquanto milhares de corpos eram cremados sem qualquer identificação. No Haiti, a tragédia se confunde com o dia a dia, porque não sabemos o que é pior: um terremoto sem precedentes ou biscoitos de barro como dieta básica na alimentação de crianças famintas. E a morte de Zilda Arns só reforça o enredo que precisamos mudar o nosso jeito de nos relacionar com a 'diferença'. Para o Brasil, a perda da senhora da pastoral da criança gera um vácuo de esperança, de moralidade e da ética pública. Agora, se você consegui, pense no Haiti, reze pelo Haiti, o Haiti é aqui, o Haiti não é aqui... Será mesmo?
Reveja agora as outras notícias que acertaram o alvo na última semana:
2ºEUA fazem de tragédia estratégia de demarcação política e militar
3ºBurocracia impede envio de grande parte das ajudas humanitárias
4º Brasil doa U$10 milhões enquanto pobres daqui precisam de 100
5º Haitianos deveriam devolver país para a natureza sob pena de morte
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